quarta-feira, 3 de julho de 2013

O paradigma digital

A cadeira de Questões Contemporâneas de Comunicação e Cultura é a única do primeiro ano de mestrado que é anual e não semestral. E é sempre leccionada por três professores externos convidados para o efeito. Este ano leccionaram a cadeira, por este ordem, Eduardo Cintra Torres, da Universidade Católica, Fausto Colombo, da Universidade Católica de Milão, e Nico Carpentier, da Universidade Livre de Bruxelas. A nós competia-nos escolher um dos temas abordados e trabalhar sobre ele. Eu gostei das aulas dos três professores, mas escolhi como tema uma das áreas tratadas - mas não aprofundada - pelo professor Fausto Colombo: a passagem do analógico para o digital.
Eu sempre intui que isso tinha alguma importância, mas estava longe de imaginar que teria o papel tão decisivo que percebi ter depois de estudar o tema.  Esta é que é verdadeiramente a mudança de paradigma que afecta todos outros campos de análise que possamos escolher para abordar as transformações em curso não só na área da comunicação, como no funcionamento geral das sociedades actuais. Penso que precisamos de perceber isso para podermos compreender o que está a passar-se na forma de distribuir socialmente a informação e sobretudo para escaparmos à tentação de olhar o que é novo à luz de instituições e categorias de análise que são velhas. Este é um erro muito frequente.
Quando escrevi os meus papers do primeiro semestre não tinha ainda tomado consciência da magnitude que representa esta mudança do analógico para o digital, porque senão ela teria sido mais central nesses primeiros trabalhos. Nem este paper o esgota. Por exemplo, não há neste trabalho nada sobre o estudo da Antropologia num mundo que deixa de ser analógico e passa a ser digital. Será que a Antropologia já meditou sobre isso? Que efeitos tem a codificação digital sobre a nossa memória colectiva? Não é óbvio que isso não pode deixar de ter efeitos transformadores massivos e profundos sobre as sociedades humanas em todas as suas vertentes?
Outra coisa que resultou para mim muito positiva deste trabalho foi ter percebido melhor como enquadrar a transformação tecnológica no quadro do livre-arbítrio dos indivíduos em sociedade e das suas escolhas colectivas. Percebi que a tecnologia não determina, dirige. Ela não impõe caminhos; ela abre caminhos possíveis. Ela constitui um substrato sobre o qual se constroem as organizações económicas e sociais humanas, assim como as escolhas pessoais dos indivíduos. As tecnologias particulares com que hoje nos confrontamos - os smartphones, os ecrãs tácteis, o wi-fi, etc - são elas próprias pequenas erupções que nascem sobre o magma transformador da transição do analógico para o digital. Esse é que é o factor decisivo para o qual devemos olhar se quisermos perceber as transformações em curso na área da comunicação.
Este transformou-se se por isso num dos três trabalhos mais importnates que já fiz até hoje neste mestrado (o de Dinâmicas Sociais da Internet é outro) e por isso será um dos pilares da minha dissertação final. O que significa que provavelmente voltará a ser citado por aqui.
O resumo do artigo diz o seguinte:
"A emergência da Sociedade em Rede introduziu mudanças significativas na forma como os agentes sociais produzem, distribuem e consomem informação, conhecimento e cultura. Uma dessas mudanças corresponde à alteração fundamental do sistema de codificação da informação, que passou de predominantemente analógico antes da Sociedade em Rede para sobretudo digital depois dela. Neste trabalho argumentaremos que a passagem da codificação analógica para a digital constitui o substrato tecnológico sobre o qual se organizam as apropriações sociais das tecnologias de informação e comunicação. Começaremos por analisar as características da codificação digital por oposição à codificação analógica, em seguida analisaremos de que forma a codificação digital condiciona o modo de produzir, distribuir e consumir informação e concluiremos avaliando como é que isso altera as condições sociais em que essa produção, distribuição e consumo acontecem."
O artigo completo pode ser lido e descarregado na minha área do academia.edu ou aqui:

Sem comentários:

Enviar um comentário