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quinta-feira, 31 de outubro de 2013

Ainda faz sentido a actualidade das notícias?

Há poucos dias um video de Maria João Pires, confrontada com um concerto (ou um ensaio, já veremos) para o qual não estava preparada tornou-se viral nas redes sociais.
A história tinha começado num jornal inglês - The Telegraph - sem ser claro se era um acontecimento recente; e era acompanhada de um video - alojado no YouTube - que era um trecho de um documentário mais longo cuja proveniência também não era clara.
Depois de a história se tornar viral nas redes sociais, quase todos os media portugueses - e até alguns espanhóis  - pegaram no assunto (como se pode ver aqui) e, ou reproduziram a história ou reproduziram o video. Primeiro facto curioso: quase nenhum acertou nas circunstâncias em que o episódio ocorreu ou quando ocorreu: foi há um ano? foi há 3 anos? Na verdade, se estiver correcto o esclarecimento "histórico" deste post no Facebook, a coisa ocorreu há 15 anos (!!!) e foi num ensaio e não num concerto.
Obviamente que é curioso que os media vão atrás das redes sociais. Isso, em si mesmo, já é motivo de reflexão para quem trabalha nos ou estuda os media. Mas isso, sinceramente, já não é novidade! Tem acontecido recorrentemente a partir do momento em que o media perceberam que as histórias virais das redes sociais lhes podiam dar pageviews. Muitas pageviews!
O que é mais interessante é a forma como este e todos os casos semelhantes questionam o conceito de actualidade das notícias. Como se pode ver no post Facebook acima e nos respectivos comentários, o que está subjacente é uma crítica à "incompetência" dos media para tratarem, profissionalmente esta história (o que significaria, provavelmente, ignorá-la! Precisamente por causa da falta de "actualidade"). Mas eu acho que, a bem do debate, devíamos experimentar voltar a questão do avesso.
Tomemos-me a mim próprio como exemplo: eu não conhecia esta história. Nenhum dos media que li há 15 anos a reproduziu (que eu me lembre) e ninguém me a recontou nos últimos 15 anos. No entanto, eu achei a história fascinante assim que tive conhecimento dela. Por isso a reproduzi. Claro que se pode perguntar, neste ponto, se eu fui verificar a respectiva "actualidade". Mas isso é voltar a entrar na espiral do imperativo de "actualidade" que referi anteriormente.
Voltar a questão do avesso significa precisamente questionar: e se fosse a "actualidade" que estivesse errada? Porque razão é que seguimos o conceito de actualidade ao ponto de acharmos que  os media são ridículos quando saem da agenda da "actualidade"?
O "caso" Maria João Pires é apenas mais um que demonstra como actualmente a circulação de informação se faz independentemente do conceito de actualidade. O que obriga a questionar se os media devem, hoje, seguir o imperativo da actualidade. A passagem do analógico para o digital tem, entre outras consequências profundas, essa (que não o é menos): a informação digital está sempre disponível e portanto o "tempo" da respectiva circulação não pode ser controlado, nem pelos media, nem por ninguém. Este video e esta história de Maria João Pires foi viral hoje, aqui, mas nada impede que não volte a reemergir daqui a 5 anos ou daqui a alguns meses noutro "local" diferente ("local" está entre aspas porque no mundo digital não há "locais", mas apesar de tudo ainda há relacionamento sociais online geograficamente fundados, ou seja, as nossas redes sociais ainda tendem a ser predominantemente "locais").
As transformações em curso na distribuição de informação na sociedade em rede geram epifenómenos como o do ressurgimento momentâneo desta história datada da pianista Maria João Pires. Embora isso possa parecer estranho, agarrar-mo-nos a categorias do antigamente - como a de "actualidade" - para explicar os fenómenos, pode gerar mais confusão do que clareza. O conceito de "timeless time" de Castells há muito que explica como e porquê o "tempo" assume contornos diferentes na sociedade em rede mediada por computadores. Ora, se o tempo, pela evolução das formas de comunicar em sociedade, se altera na sua natureza, porque razão não se deveria alterar o conceito de "actualidade" a que os media estão aparentemente tão imperiosamente submetidos? Os media podem ir atrás das histórias virais para conseguirem pageviews. E podem fazê-lo com mais ou menos "elegância". Mas nunca perceberão o que realmente está a acontecer enquanto não perceberem as consequências práticas dos conceitos de "timeless time" e "space of flows". Há "novos media" que - sem os constrangimentos da "actualidade", entre outros - estão a ocupar esse "espaço".
No limite é possível que a aceleração exponencial do tempo gere no final a sua supressão, como propõe Harmut Rosa no livro "Social Acceleration". Um "frenetic standstill" em que tudo acontece a todo o tempo e portanto nada muda na realidade e nada tem um rumo. Ou seja, a pós-história ou o fim da história. Aliás, se pensarmos que - como eu aprendi com Marc Bloch - a história começou com a invenção da escrita (o registo analógico dos acontecimentos), é pelo menos plausível que o registo digital dos acontecimentos altere novamente o conceito de história. Mas isso, é outra discussão... (to be continued).

P.S. Para quem achar que estas ideias são arrojadas, tenho um desafio ainda mais arrojado e - este sim - verdadeiramente assustador! Experimentem reler os parágrafos anteriores e substituir "actualidade" por "veracidade"...

quarta-feira, 27 de março de 2013

Present Shock!


O conceito de timeless time que Castells associa à comunicação na era da sociedade em rede é levado ao extremo por Douglas Rushkoff neste livro recente: "Present Shock - When Everything Happens Now".
Para já é um trocadilho interessante - e assumido (explicado num dos videos abaixo) com o "Future Shock" do Alvin Toffler. Mas, sobretudo, leva o conceito de timeless time muito mais além e questiona muitos outros parâmteros da civilização a partir da era digital.
Obviamente, Douglas Rushkoff não é um cientista nem isto é ciência. Mas, quem tiver paciência para acompanhar os videos, pode encontrar muitas ideias de investigação bem interessantes.
Para mim, o tema do shift analógico/digital é central como tema de estudo, pelas consequências que parece ter não só na maneira como transmitimos informação (em sentido lato) como também na maneira como nos apropriamos dela, a arquivamos, a reutilizamos, etc. Nessa medida, as teses de Rushkoff são interessantes e desafiadoras. Ainda não consegui encontrar este livro em formato digital, mas estou a ansioso por lhe "deitar a mão". Não tarda nada vem pela Amazon em formato "sumo de árvore"!
Eis um video onde Douglas Rushkoff explica o que é o "Presente Shock". É um video longo, mas está carregado de ideias interessantes a todos os níveis. Além disso, o homem é tão frenético que chega a ser hilariante! Faz lembrar o Woody Allen. Quem preferir um video mais pequeno tem este, que também é recente, numa conferência da O'Reilly - http://youtu.be/cdawqlu0_JU - seguido de uma conversa com Eva Williams, um dos fundadores do Twitter - http://youtu.be/_MPXe4JwfAc




Por outro lado, uma fenómeno interessante - porque de certa forma incongruente - de que temos falado nas aulas de mestrado é o dos "drop-outs", as pessoas que embora reunindo os meios e as literacias para os usarem, abandonam voluntariamente a internet e/ou as redes sociais.
As teses de Rushkoff também são obviamente interessantes nessa perspectiva, porque sublinham o potencial de ansiedade que o o timeless time da era digital pode insinuar em quem não for capaz de prescindir de uma grau mínimo de controle. Nessa media, é interessante acompanhar esta conversa entre Rushkoff e Paul Miller, o jornalista do The Verge que há quase um ano decidiu "sair da internet" e voltar para contar a história.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Intemporalidade, convergência e revolução

Quando vi a mais recente campanha da Zon, criada sobre o conceito "Timewarp - Viajo no tempo", lembrei-me logo da noção de "timeless time" de Manuel Castells.
Aliás, há quase um mês tinha chamado a atenção para a forma como a campanha do Meo evocava uma das acepções daquilo que se pode entender como convergência dos media segundo Henry Jenkins.
Que as duas maiores "transportadoras de sinal" nacionais toquem em dois dos conceitos mais fundamentais da nova paisagem comunicativa, isso é em si mesmo uma coincidência interessante.
Mas na realidade pode significar bem mais do que uma mera coincidência. Porque - estou eu aqui a pensar - o que isto significa, basicamente, é que a Zon acabou de descobrir - e está a tentar monetizar - um dos traços constitutivos da arquitectura da comunicação em rede: a bidireccionalidade. E a questão nem sequer é se vai (vão...) a tempo. A questão é se isso faz sentido. Porque o facto de os canais de comunicação na internet funcionarem nos dois sentidos é tão natural para a rede como respirar é para o ser humano. Por isso, de certa forma, o que a Zon e a Meo estão a fazer é praticamente o mesmo que os jornais fizeram quando criaram websites para colocar as notícias online; que é fazer mais ou menos a mesma coisa para responder a uma realidade que é radicalmente diferente. Estamos a perceber hoje, nos jornais, que não sabemos o que é que vai ser o futuro da comunicação, mas sabemos que não vai ser isso.
Com as "transportadoras de sinal" pode estar a passar-se algo semelhante. Procuram estar onde "está o negócio" na esperança - se calhar vã - de que exista de todo um negócio no futuro da comunicação. Pode estar a começar acontecer-lhes agora o mesmo que aconteceu aos jornais e revistas quando lançaram os seus primeiros websites. Querem estar ali porque aqui já não se está bem. O que não quer dizer que ali se esteja melhor!
Afinal, o que é que fez o Skype às operadoras telefónicas tradicionais? O que é que o Facetime fez ao Skype? Ou o Facebook ao Facetime? Ou o Google+ ao Facebook? Podíamos ficar aqui eternamente a argumentar futilmente sobre quem ganhou a quem, sem repararmos no facto essencial de que todos perderam. A abundância de informação reduz o seu valor assim como a multiplicação de canais reduz o potencial de rentabilidade de cada um. E não há nada mais multiplicador do que tornar bidireccional aquilo que antes era unidireccional.
Obviamente, tudo o que está para cima é especulação e futurologia. Na verdade é algo que nem devia ser "permitido" num blogue "académico". Mas serve para ilustrar que é isso precisamente que pretendo estudar cientificamente neste mestrado. Não o modelo de negócio das operadoras de internet - ou pelo menos não apenas - mas a própria ideia de um modelo de negócio como forma viável ou desejável de transmitir socialmente a informação na era da internet. Esse tem sido o traço comum a tudo o que tenho feito neste mestrado e irá continuar a sê-lo no futuro.
Hão-de emergir, se não certezas, pelo menos convicções cientificamente fundadas. Uma das que já vislumbro - que que já tive oportunidade de tratar num trabalho ou outro - tem a ver com a escala global em que operam as Google e Facebook deste mundo. Ao contrário do que normalmente se pensa - argumento eu... - não é que elas sejam ricas porque são globais. É exactamente o contrário: elas NÃO SÃO pobres porque são globais. E é porque as vemos globalmente que perdemos de vista que o seu "modelo de negócio" está na realidade tão deteriorado como os outros. Dito de outra forma, quando valorizamos em bolsa uma Google ou Facebook pelo potencial de negócio que resulta do facto de ela operar globalmente (tem não-sei-quantos milhões de utilizadores...), estamos a valorizá-la com "instrumentos de medida" concebidos para o nosso mundo; não para o próximo! Estamos a valorizá-la em função do potencial que achamos que ela pode gerar devido ao número de clientes e não em função do que ela efectivamente gera por cada cliente que serve. Ou seja, é intrínseco à forma como a informação se torna abundante e os canais se multiplicam socialmente que o valor unitário da informação necessariamente se reduz. E não há nada que nem a Google nem o Facebook possam fazer quanto a isso. A não ser, talvez, esconder a evidência com a exuberância dos seus "números". Um dia espero poder estudá-lo e prová-lo!