domingo, 14 de julho de 2013

Porquê estudar o valor da informação?

Na cadeira de Desenho de Pesquisa, é-nos pedido que desenhemos o plano de pesquisa para a investigação que queremos fazer neste mestrado e que deverá culminar na dissertação de mestrado. Para mim isto foi relativamente simples, uma vez que aquilo que pretendo investigar já está (já estava) bastante bem definido dentro da minha cabeça e também porque, salvo uma ou duas excepções, tenho conseguido "ligar" o trabalho feito  em cada uma das cadeiras com o objectivo final da investigação que pretendo fazer no mestrado.
Esta investigação prende-se o valor social e económico da informação e o trabalho abaixo explica detalhadamente o porquê da escolha deste tema, os métodos que serão seguidos e as hipóteses de estudo. Mas eu queria destacar aqui um uma ou duas ideias principais e apontar para as conclusões esperadas.
Eu sempre achei que os meios de comunicação social tinham um peso decisivo na vivência social e na construção da cidadania. Em parte foi por isso que escolhi estudar e trabalhar em jornalismo. Aliás, já repeti mais do que uma vez que, na época, jornalista, médico e juiz eram aqueles 3 papéis que para mim eram mais do que meras profissões; eram missões!.
Por outro lado, desde cedo percebi também que o surgimento da internet alterava profundamente o papel e a relevância social dos meios de comunicação. A princípio parecia-me que isso tinha a ver com o seu modelo de negócio e que, uma vez encontrado um novo modelo de negócio, o equilíbrio seria reestabelecido, provavelmente com outros actores, mas proporcionando o mesmo resultado: assegurar a distribuição social de informação. Esta é aliás, provavelmente, a tese dominante actualmente.
Mas, ultimamente, tenho olhado cada vez mais para a distribuição social de informação pelo prisma analítico das suas instituições. Ou seja, aquilo a que nós chamamos mass media - os jornais, as revistas, as televisões - são formas institucionais de distribuir informação socialmente relevante. E aliás, são formas institucionais grandemente regulamentadas (de diversas formas) e profundamente "historicizadas". O que está a acontecer actualmente - parece-me - é uma construção social de novas instituições para fazer a mesma coisa, sendo que este processo está apenas no princípio. Obviamente, essa construção far-se-á com avanços e recuos, com viragens à direita ou à esquerda, consoante as forças sociais e económicas em colisão. Mas far-se-á inevitavelmente. Este trabalho é sobre isso. Mas, por isso mesmo, não pretendo que se restrinja ao modelo de negócio dos mass media (embora isso já fosse tarefa importante!). O que quero é compreender as formas sociais que escolhemos para distribuir informação e de que forma e que elas mudaram na transição para a sociedade em rede alimentada por tecnologias digitais. Ou seja, é um tema vasto - com duas vertentes bem claras, a económica e a social - mas que pode ser circunscrito às hipóteses e aos métodos de pesquisa descritos neste trabalho.
Queria também falar das conclusões esperadas. Basicamente porque quando estava a projectar a pesquisa, elas assustaram-me um pouco. Mas - sinceramente - são aquelas que penso que esta investigação irá produzir:

  1. O modelo de negócio dos mass media está esgotado e não pode ser recuperado no quadro da sociedade em rede
  2. O modelo de negócio dos novos media da sociedade em rede depende de uma escala global e só existe em função dela (o que explica a tendência para um só operador por sector)
  3. Contribuir para uma investigação mais abrangente sobre formas alternativas de atribuir valor à informação no quadro da sociedade em rede, considerando que o modelo actual está esgotado e é preciso encontrar um modelo alternativo que garanta as funções sociais de distribuição de informação dentro de parâmetros de racionalidade económica e relevância e adequação social.
Este último é obviamente o resultado mais importante que esta investigação pode produzir, mas é também o mais ambicioso e difícil. Por isso é que está projectado apenas como um contributo. Não espero com o trabalho desenvolvido neste mestrado responder a essa questão - formas alternativas (e sustentáveis) de garantir a distribuição social de informação na sociedade em rede - mas espero, com a investigação sobre o papel dos mass media vs. new media, poder contribuir para esse objectivo.

O trabalho que descreve em pormenor o meu projecto de pesquisa pode ser lido na íntegra na minha área do academia.edu ou aqui:

A geração digital


Para a cadeira de Literacia dos Novos Média tinha desde o início projectado analisar comparativamente as literacias exibidas pelos nativos digitais face àqueles que foram "nascidos e criados" no mundo dos mass media. Muitas vezes brincamos com isso no nosso dia-a-dia, comentando a forma a aparentemente simples como as crianças apreendem a forma de funcionamento dos novos media por comparação com a dificuldade que os mais velhos demonstram para o fazer. Isso voltou a ser moda nos videos virais a propósito do surgimento dos tablet e do carácter aparentemente intuitivo com que as crianças os usam. Houve vários videos muito populares sobre isso.
Obviamente, conhecia relativamente bem as teses de Don Tapscott e também, embora mais superficialmente, as de Nicholas Negroponte. E estes dois autores serviram de base ao trabalho para esta cadeira. Mas, por uma contingência cronológica, fiz este trabalho depois de fazer o de Questões Contemporâneas de Comunicação e Cultura, sobre a migração do analógico para o digital. E, por isso, em vez de tentar comparar as literacias de uns e outros dos protagonistas identificados acima, optei por tentar perceber de que forma é que as mutações resultantes da migração do analógico para o digital tinham nas literacias exibidas pelo nativos digitais. Dito de outro modo, tentei combinar a comparação referida com uma tentativa de a explicar como uma forma de apropriar tecnologias que são fundamental e essencialmente diferentes. Ou seja, o que me interessava era menos os estudos empíricos sobre a forma de apropriar esta ou aquela tecnologia e mais a forma de incorporar na comunicação e na relação social as mutações de base resultantes da mudança do analógico para o digital.
Este foi provavelmente o trabalho realizado até agora em que mais fiquei com a noção que havia muito mais para ler, para analisar e para escrever. Estive apenas a esgravatar a superfície de um tema que por si só dava uma tese de doutoramento. Mas que para mim era apenas um input parcial para outro tema diferente. Talvez tenha sido por isso que este trabalho foi dos que me correu pior. Deu-me menos gosto a fazer que os outros e o resultado penso que transparece isso. Ainda assim, ele aqui está. O resumo diz o seguinte:

"Na sociedade em rede conectada por comunicação mediada por computador, a produção, distribuição e consumo de informação e de bens culturais é cada vez mais dominantemente feita no formato digital. E esse facto altera não só os conteúdos informativos e culturais, mas também a forma de os apreender e incorporar no quotidiano social dos indivíduos. Neste trabalho partimos de uma análise às características mais marcantes e distintivas do formato digital de codificação face ao formato analógico para encontrar uma correspondência com o tipo de novas literacias evidenciadas pelos nativos digitais e desse modo estabelecer uma dicotomia entre esta geração e as anteriores. A hipótese subjacente a este trabalho é que os novos formatos digitais de produção, distribuição e consumo de informação, conhecimento e cultura na sociedade em rede são apropriados socialmente pelos indivíduos mediante novas literacias de media. Começaremos por analisar quais são as características distintivas dos novos media digitais, depois analisaremos quais as literacias evidenciadas pela actual geração de nativos digitais face à geração anterior a partir de estudos e análises já publicadas e, por fim, concluiremos analisando de que forma essas literacias são úteis nos outros campos de desenvolvimento da sociedade em rede."
O artigo completo está na minha página do academia.edu ou aqui:

quarta-feira, 3 de julho de 2013

O paradigma digital

A cadeira de Questões Contemporâneas de Comunicação e Cultura é a única do primeiro ano de mestrado que é anual e não semestral. E é sempre leccionada por três professores externos convidados para o efeito. Este ano leccionaram a cadeira, por este ordem, Eduardo Cintra Torres, da Universidade Católica, Fausto Colombo, da Universidade Católica de Milão, e Nico Carpentier, da Universidade Livre de Bruxelas. A nós competia-nos escolher um dos temas abordados e trabalhar sobre ele. Eu gostei das aulas dos três professores, mas escolhi como tema uma das áreas tratadas - mas não aprofundada - pelo professor Fausto Colombo: a passagem do analógico para o digital.
Eu sempre intui que isso tinha alguma importância, mas estava longe de imaginar que teria o papel tão decisivo que percebi ter depois de estudar o tema.  Esta é que é verdadeiramente a mudança de paradigma que afecta todos outros campos de análise que possamos escolher para abordar as transformações em curso não só na área da comunicação, como no funcionamento geral das sociedades actuais. Penso que precisamos de perceber isso para podermos compreender o que está a passar-se na forma de distribuir socialmente a informação e sobretudo para escaparmos à tentação de olhar o que é novo à luz de instituições e categorias de análise que são velhas. Este é um erro muito frequente.
Quando escrevi os meus papers do primeiro semestre não tinha ainda tomado consciência da magnitude que representa esta mudança do analógico para o digital, porque senão ela teria sido mais central nesses primeiros trabalhos. Nem este paper o esgota. Por exemplo, não há neste trabalho nada sobre o estudo da Antropologia num mundo que deixa de ser analógico e passa a ser digital. Será que a Antropologia já meditou sobre isso? Que efeitos tem a codificação digital sobre a nossa memória colectiva? Não é óbvio que isso não pode deixar de ter efeitos transformadores massivos e profundos sobre as sociedades humanas em todas as suas vertentes?
Outra coisa que resultou para mim muito positiva deste trabalho foi ter percebido melhor como enquadrar a transformação tecnológica no quadro do livre-arbítrio dos indivíduos em sociedade e das suas escolhas colectivas. Percebi que a tecnologia não determina, dirige. Ela não impõe caminhos; ela abre caminhos possíveis. Ela constitui um substrato sobre o qual se constroem as organizações económicas e sociais humanas, assim como as escolhas pessoais dos indivíduos. As tecnologias particulares com que hoje nos confrontamos - os smartphones, os ecrãs tácteis, o wi-fi, etc - são elas próprias pequenas erupções que nascem sobre o magma transformador da transição do analógico para o digital. Esse é que é o factor decisivo para o qual devemos olhar se quisermos perceber as transformações em curso na área da comunicação.
Este transformou-se se por isso num dos três trabalhos mais importnates que já fiz até hoje neste mestrado (o de Dinâmicas Sociais da Internet é outro) e por isso será um dos pilares da minha dissertação final. O que significa que provavelmente voltará a ser citado por aqui.
O resumo do artigo diz o seguinte:
"A emergência da Sociedade em Rede introduziu mudanças significativas na forma como os agentes sociais produzem, distribuem e consomem informação, conhecimento e cultura. Uma dessas mudanças corresponde à alteração fundamental do sistema de codificação da informação, que passou de predominantemente analógico antes da Sociedade em Rede para sobretudo digital depois dela. Neste trabalho argumentaremos que a passagem da codificação analógica para a digital constitui o substrato tecnológico sobre o qual se organizam as apropriações sociais das tecnologias de informação e comunicação. Começaremos por analisar as características da codificação digital por oposição à codificação analógica, em seguida analisaremos de que forma a codificação digital condiciona o modo de produzir, distribuir e consumir informação e concluiremos avaliando como é que isso altera as condições sociais em que essa produção, distribuição e consumo acontecem."
O artigo completo pode ser lido e descarregado na minha área do academia.edu ou aqui:

sábado, 20 de abril de 2013

"1984" ou "Admirável Mundo Novo"?




Desde que estou a estudar neste mestrado já ouvi falar dezenas de vezes do "1984" de George Orwell. Obviamente a magnitude das transformações em curso, nas nossas formas de comunicar e nas nossas formas de nos relacionarmos socialmente, induz visões utópicas ou distópicas da realidade.
Mas não é isso que me ocupa agora. Esta questão voltou a ocupar-me esta semana à medida que via, à distância e sem o acompanhamento que merece, a forma como as redes sociais e o "user generated-content" foi usado na investigação (e captura) dos suspeitos do antentado de Boston. Isso fez-me lembrar aquela notável frase acima (que li pela primeira vez num trabalho de primeiro semestre de um colega sobre as questões da vigilância), uma desconstrução de Mark Miller sobre a célebre frase de George Orwell (provavelmente uma das frases mais famosas do Mundo): "Big Brother is watching you!".
Como a investigação de Boston demonstra à evidência, o verdadeiro potencial de vigilância não é externo à sociedade; é interno a ela. Não será imposto de fora para dentro; será imposto de dentro para fora!  O "Big Brother", realmente, se alguma vez existir (porque às vezes esquecemo-nos que as distopias são tão credíveis como as utopias...), será o conjunto dos cidadãos a controlarem o conjunto dos cidadãos.
Por isso é que eu acho que, se as pessoas que estudam comunicação e sociedade quiserem realmente servir-se de uma distopia, a escolha certa não é o "1984" do George Orwell; é o "Admirável Mundo Novo" do Aldous Huxley (aliás, se quiserem ver o Gattaca, também poderão tirar alguns "ensinamentos" interessantes). A vantagem do "Admirável Mundo Novo" sobre o "1984" é que o segundo é feito de fora para dentro, um escritor olha para a sociedade e recobre-a com a sua visão distópica da sua evolução; enquanto o primeiro é feito de dentro para fora, a distopia é enredada no próprio tecido da sociedade. Talvez seja uma heresia literária, mas o que me parece é que "1984" é um objecto literário enquanto o "Admirável Mundo Novo" é um objecto científico. Onde num existe literatura, no outro existe ciência. Por isso é que o segundo seria uma melhor distopia para invocar num mestrado de comunicação e sociedade.
Aliás, só ao pesquisar para este post é que percebi que Neil Postman, um investigador que já citei por várias vezes no primeiro semestre, já se tinha apercebido há muito desta fundamental diferença entre Huxley e Orwell (ou, mais correctamente, entre o "1984" e o "Admirável Mundo Novo"). Diz ele, em "Amusing Ourselves to Death"
What Orwell feared were those who would ban books. What Huxley feared was that there would be no reason to ban a book, for there would be no one who wanted to read one. Orwell feared those who would deprive us of information. Huxley feared those who would give us so much that we would be reduced to passivity and egotism. Orwell feared that the truth would be concealed from us. Huxley feared the truth would be drowned in a sea of irrelevance. Orwell feared we would become a captive culture. Huxley feared we would become a trivial culture, preoccupied with some equivalent of the feelies, the orgy porgy, and the centrifugal bumblepuppy. As Huxley remarked in Brave New World Revisited, the civil libertarians and rationalists who are ever on the alert to oppose tyranny "failed to take into account man's almost infinite appetite for distractions." In 1984, Orwell added, people are controlled by inflicting pain. In Brave New World, they are controlled by inflicting pleasure. In short, Orwell feared that what we fear will ruin us. Huxley feared that our desire will ruin us.
Obviamente, a ideia de pôr os cidadãos (e os seus telemóveis, as suas câmaras, a suas fotografias) à procura de um criminoso, qualquer que ele seja, é muito assustadora.  E este caso de Boston merece um estudo profundo (que, não tenho dúvidas, alguém do MIT estará a preparar!) nesse aspecto, pois pode ser um case-study com alguns elementos inéditos.
Mas aquilo se inscreve na sociedade será sempre mais importante do que aquilo que se inscreve sobre ela. É essa a lição que Huxley nos dá e é por isso que as suas "previsões" podem ser muito mais úteis em termos científicos do que as do "1984" de Orwell. Se querem uma distopia (???), escolham esta!

quarta-feira, 27 de março de 2013

Present Shock!


O conceito de timeless time que Castells associa à comunicação na era da sociedade em rede é levado ao extremo por Douglas Rushkoff neste livro recente: "Present Shock - When Everything Happens Now".
Para já é um trocadilho interessante - e assumido (explicado num dos videos abaixo) com o "Future Shock" do Alvin Toffler. Mas, sobretudo, leva o conceito de timeless time muito mais além e questiona muitos outros parâmteros da civilização a partir da era digital.
Obviamente, Douglas Rushkoff não é um cientista nem isto é ciência. Mas, quem tiver paciência para acompanhar os videos, pode encontrar muitas ideias de investigação bem interessantes.
Para mim, o tema do shift analógico/digital é central como tema de estudo, pelas consequências que parece ter não só na maneira como transmitimos informação (em sentido lato) como também na maneira como nos apropriamos dela, a arquivamos, a reutilizamos, etc. Nessa medida, as teses de Rushkoff são interessantes e desafiadoras. Ainda não consegui encontrar este livro em formato digital, mas estou a ansioso por lhe "deitar a mão". Não tarda nada vem pela Amazon em formato "sumo de árvore"!
Eis um video onde Douglas Rushkoff explica o que é o "Presente Shock". É um video longo, mas está carregado de ideias interessantes a todos os níveis. Além disso, o homem é tão frenético que chega a ser hilariante! Faz lembrar o Woody Allen. Quem preferir um video mais pequeno tem este, que também é recente, numa conferência da O'Reilly - http://youtu.be/cdawqlu0_JU - seguido de uma conversa com Eva Williams, um dos fundadores do Twitter - http://youtu.be/_MPXe4JwfAc




Por outro lado, uma fenómeno interessante - porque de certa forma incongruente - de que temos falado nas aulas de mestrado é o dos "drop-outs", as pessoas que embora reunindo os meios e as literacias para os usarem, abandonam voluntariamente a internet e/ou as redes sociais.
As teses de Rushkoff também são obviamente interessantes nessa perspectiva, porque sublinham o potencial de ansiedade que o o timeless time da era digital pode insinuar em quem não for capaz de prescindir de uma grau mínimo de controle. Nessa media, é interessante acompanhar esta conversa entre Rushkoff e Paul Miller, o jornalista do The Verge que há quase um ano decidiu "sair da internet" e voltar para contar a história.

sábado, 16 de março de 2013

Marx lives!

Não, não me refiro ao Groucho! Estou a falar do Karl, mesmo! Carlitos para o amigos.
Preparando este artigo - aliás excelente! - para uma apresentaçãpo em aula - "Loser Generated Content: From Participation to Exploitation", de Søren Mørk Petersen  - voltei a deparar (não é a primeira vez neste mestrado) com o cruzamento entre o marxismo e as novas tecnologias de informação e comunicação, nomeadamente no que se refere às suas consequências económicas e sociais. Que é precisamente aquilo que pretendo estudar.
A partir deste artigo descobri também esta tese de doutoramento de Nick Dyer-Witheford, que faz uma releitura de Marx à luz das novas TIC: "Cyber-Marx : cycles and circuits of struggle in high technology capitalism" (que aliás está integralmente disponível online através de uma licença Creative Commons).
O que Søren Mørk Petersen insinua e Nick Dyer-Witheford afirma claramente é que a releitura de Marx neste contexto tanto pode dar para explicar os desenvolvimentos actuais como uma extensão e até exponencialização do capitalismo, como para os apresentar como o prólogo da realizção d ideal comunista sobre a terra. Fala Dyer-Witheford:
"(...) the information age, far from transcending the historic conflict between capital and its labouring subjects, constitutes the latest battleground in their encounter; how the new high technologies--computers, telecommunications, and genetic engineering--are shaped and deployed as instruments of an unprecedented, world wide order ofgeneral commodification; and how, paradoxically, arising out of this process appear forces which could produce a different future based on the common sharing of wealth--a twenty-first century communism."
Ou seja, mais uma vez, parece estarmos perante a escolha entre a utopia e a distopia, como tantas vezes temos falado neste mestrado. Por um lado, a recorrência dessa dicotomia parece impor uma releitura de Marx neste quadro. Eu li Marx, directamente, enquanto jovem. Mas, para ser sincero, aquilo já me parecia um pouco desligado da realidade à época, quanto mais agora! Mas de facto, a reinterpretação de Marx no contexto actual parece fazer todo o sentido, sobretudo no quadro de uma investigação sobre o valor e a atribuição de valor nos processos comunicativos e informativos do nosso tempo. Ou seja, abre-se aqui um linha de investigação interessante que sem dúvida irei trilhar no futuro.
Por outro lado, como Petersen também refere, o que é preciso é uma nova abordagem sobre o valor do trabalho (para usar um termo central no marxismo) neste contexto, o que significa investigar e analisar as questões do acréscimo de valor colocado nas produções culturais e informativas. O que quer dizer que estou no bom caminho!

P.S. Já agora: percebi que Søren Mørk Petersen foi escrito antes da tese de doutoramento. Esta tem o título "Common Banality: The Affective Character of Photo Sharing, Everyday Life and Produsage Cultures" e também me parece interessante. Mas ainda não a consegui encontrar onlie em lado nenhum... Se alguém a encontrar...

quinta-feira, 14 de março de 2013

Intemporalidade, convergência e revolução

Quando vi a mais recente campanha da Zon, criada sobre o conceito "Timewarp - Viajo no tempo", lembrei-me logo da noção de "timeless time" de Manuel Castells.
Aliás, há quase um mês tinha chamado a atenção para a forma como a campanha do Meo evocava uma das acepções daquilo que se pode entender como convergência dos media segundo Henry Jenkins.
Que as duas maiores "transportadoras de sinal" nacionais toquem em dois dos conceitos mais fundamentais da nova paisagem comunicativa, isso é em si mesmo uma coincidência interessante.
Mas na realidade pode significar bem mais do que uma mera coincidência. Porque - estou eu aqui a pensar - o que isto significa, basicamente, é que a Zon acabou de descobrir - e está a tentar monetizar - um dos traços constitutivos da arquitectura da comunicação em rede: a bidireccionalidade. E a questão nem sequer é se vai (vão...) a tempo. A questão é se isso faz sentido. Porque o facto de os canais de comunicação na internet funcionarem nos dois sentidos é tão natural para a rede como respirar é para o ser humano. Por isso, de certa forma, o que a Zon e a Meo estão a fazer é praticamente o mesmo que os jornais fizeram quando criaram websites para colocar as notícias online; que é fazer mais ou menos a mesma coisa para responder a uma realidade que é radicalmente diferente. Estamos a perceber hoje, nos jornais, que não sabemos o que é que vai ser o futuro da comunicação, mas sabemos que não vai ser isso.
Com as "transportadoras de sinal" pode estar a passar-se algo semelhante. Procuram estar onde "está o negócio" na esperança - se calhar vã - de que exista de todo um negócio no futuro da comunicação. Pode estar a começar acontecer-lhes agora o mesmo que aconteceu aos jornais e revistas quando lançaram os seus primeiros websites. Querem estar ali porque aqui já não se está bem. O que não quer dizer que ali se esteja melhor!
Afinal, o que é que fez o Skype às operadoras telefónicas tradicionais? O que é que o Facetime fez ao Skype? Ou o Facebook ao Facetime? Ou o Google+ ao Facebook? Podíamos ficar aqui eternamente a argumentar futilmente sobre quem ganhou a quem, sem repararmos no facto essencial de que todos perderam. A abundância de informação reduz o seu valor assim como a multiplicação de canais reduz o potencial de rentabilidade de cada um. E não há nada mais multiplicador do que tornar bidireccional aquilo que antes era unidireccional.
Obviamente, tudo o que está para cima é especulação e futurologia. Na verdade é algo que nem devia ser "permitido" num blogue "académico". Mas serve para ilustrar que é isso precisamente que pretendo estudar cientificamente neste mestrado. Não o modelo de negócio das operadoras de internet - ou pelo menos não apenas - mas a própria ideia de um modelo de negócio como forma viável ou desejável de transmitir socialmente a informação na era da internet. Esse tem sido o traço comum a tudo o que tenho feito neste mestrado e irá continuar a sê-lo no futuro.
Hão-de emergir, se não certezas, pelo menos convicções cientificamente fundadas. Uma das que já vislumbro - que que já tive oportunidade de tratar num trabalho ou outro - tem a ver com a escala global em que operam as Google e Facebook deste mundo. Ao contrário do que normalmente se pensa - argumento eu... - não é que elas sejam ricas porque são globais. É exactamente o contrário: elas NÃO SÃO pobres porque são globais. E é porque as vemos globalmente que perdemos de vista que o seu "modelo de negócio" está na realidade tão deteriorado como os outros. Dito de outra forma, quando valorizamos em bolsa uma Google ou Facebook pelo potencial de negócio que resulta do facto de ela operar globalmente (tem não-sei-quantos milhões de utilizadores...), estamos a valorizá-la com "instrumentos de medida" concebidos para o nosso mundo; não para o próximo! Estamos a valorizá-la em função do potencial que achamos que ela pode gerar devido ao número de clientes e não em função do que ela efectivamente gera por cada cliente que serve. Ou seja, é intrínseco à forma como a informação se torna abundante e os canais se multiplicam socialmente que o valor unitário da informação necessariamente se reduz. E não há nada que nem a Google nem o Facebook possam fazer quanto a isso. A não ser, talvez, esconder a evidência com a exuberância dos seus "números". Um dia espero poder estudá-lo e prová-lo!